sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Perguntado sobre a evolução das ciências matemáticas em Portugal, disse o prof. Monteiro que «o caminho dos matemáticos portugueses é emigrar. Isto é o que se observa» Agora, vêm eles para o Brasil, onde encontram uma segunda pátria. Não seria este, certamente, o desejo desses matemáticos se tivessem o auxílio que merecem».


Declarações do prof. Aniceto Monteiro

Encontra-se no Rio de Janeiro, a convite do Centro Brasileiro de Pcsquisas Físicas, o ilustre matemático português, prof. António Aniceto Monteiro. À sua chegada, em meados de dezembro, à capital federal, o ilustre cientista fez as seguintes declarações à imprensa:
«Não existe o intercâmbio luso-brasiletro. Portugal envia para o Brasil pessoas escolhidas por critério de ordem política, gente que não representa a inteligência portuguesa o que só serve, em geral, para aumentar o repertório do anedotário sobre os portugueses.
A lista dos intelectuais lusitanos perseguidos pelo fascismo é imensa, isto porque a inteligência portuguesa se mantém ao lado do povo, na luta contra o regime, que asfixia o país há 33 longos anos».
«Os alunos da escola primaria do meu país vestem, obrigatoriamente, o uniforme verde dos «lusitos» e os da escola secundaria o uniforme castanho da mocidade portuguesa. São obrigados a desfilar de mãos estendidas à fascista e marcham a passo do ganso. E os professores universitários são expulsos das suas cátedras, por manifestarem sua oposição ao regime asfixiante».

Cultura desenvolve-se em democracia
O prof. António Anitceto Monteiro veio ao Brasil, eomo acima dissemos, a convite do Centro Brasileiro do Pesquisas Físicas, instituição da qual é fundador, Já lecionou na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, de 1945 a 1948. Atualmente entá radicado na Argentina, contratado pela Universidade do Sul, para organizar um Instituto de Matemática. Tem 52 anos, nasceu em Mossamedes, na colônia portuguesa de Angola. Ê licenciado em Ciências Matemáticas pela Universidade de Lisboa e dou-tor pela Sorbonne; membro correspondente da Academia Brasileira de Ciências, laureado pela Academia de Ciências de Lisboa com o Prémio Artur Malheiros.
«Preciso falar de política, porque o desenvolvimento da cultura só é possível quando existem as liberdades democráticas fundamentais» — declarou o prof. Antônio Monteiro. — «A maior riqueza de um país, são as imensas reservas de inteligência existentes nas amplas camadas populares, que só podem revelar-se numa atmosfera de progresso».

Matemáticos emigram
Perguntado sobre a evolução das ciências matemáticas em Portugal, disse o prof. Monteiro que «o caminho dos matemáticos portugueses é emigrar. Isto é o que se observa» Agora, vêm eles para o Brasil, onde encontram uma segunda pátria. Não seria este, certamente, o desejo desses matemáticos se tivessem o auxílio que merecem».

Censura
Disse, mais, que «em Portugal não existe nenhuma liberdade democrática fundamental». «Eu nunca votei em meu país. Os jornais estão submetidos à censura».
O prof. Antônio Aniceto Monteiro concluiu suas declarações lembrando a figura de Tiradentes, «exemplo que ilustra a ferocidade manifestada pela reação portuguesa, sempre que governou o país. Tiradentes deve estar sempre presente no espirito dos portugueses que desejam um Portugal livre e independente» — concluiu.

Artigo do «Portugal Democrático», nº32, 1960.
O documento aqui reproduzido consta do Processo 558/67-SR, NP-3577 (folha 40), do Arquivo da PIDE/DGS, relativo a António Aniceto Monteiro, existente na Torre do Tombo (IAN/TT).