Estas palestras [as duas palestras de António Monteiro sobre Geometrias Finitas e Álgebra finita e Geometria analítica], que se destinavam a um público muito amplo e a que ocorreram efectivamente jovens de todas as Faculdades da Universidade do Porto, deveriam levar à tentativa de organizar no Porto, um clube de Matemática, a exemplo do que já acontecera em Lisboa.
Porém, a intervenção do próprio Ministro do Interior impediu a sua concretização, tal o impacto que causaram em toda a população universitária.
É curioso observar que, nessa época, já funcionavam vários clubes de Matemática em Lisboa, clubes que foram todos encerrados logo em seguida às palestras de Monteiro no Porto.
Para o governo de então, Geometrias finitas, Extensões Algébricas de Corpos e temas semelhantes eram altamente subversivos e punham em risco as instituições vigentes. (...)
Entretanto, no final de 1943 ia proporcionar-se a oportunidade de António Monteiro vir para o Porto e permanecer connosco quase um ano.
Como diz António Monteiro no seu curriculum
“durante o período de 1938-43 todas as minhas funções docentes e de investigação, foram desempenhadas sem remuneração; ganhei a vida dando lições particulares e trabalhando num Serviço de Inventariação de Bibliografia Científica existente em Portugal, organizado pelo IAC”.
Em contraste flagrante com o desinteresse assim manifestado pelas autoridades responsáveis pelo ensino superior do nosso país, comportando-se como se desconhecessem a presença em Portugal de um investigador da categoria de António Monteiro, a Faculdade de Filosofia do Brasil (Rio de Janeiro), por recomendação de Albert Einstein, J. von Neumann e Guido Beck, dirigia-lhe, em Setembro de 1943, um convite para assumir a cátedra de Análise Superior.
Já quando tinha decidido viajar para o Brasil, aceitando aquele convite, funda a Junta de Investigação Matemática, em colaboração com A. de Mira Fernandes e Ruy Luís Gomes. (...)
No documento da fundação da JIM, em que estes objectivos [Os objectivos da Junta de Investigação Matemática] eram proclamados, convidam-se a ingressar na Junta todos aqueles que se interessem por uma tal iniciativa.
Era, porém, evidente, sem meios materiais, seria impossível dar realização a um programa tão ambicioso e foi precisamente com tal objectivo que um grupo de professores e antigos alunos da Faculdade de Ciências do Porto criou a Dotação da Junta de Investigação Matemática e fez distribuir uma circular que era um apelo para recolha de fundos.
Todos nós sentíamos as dificuldades de uma tarefa deste tipo, quando surgiu Alguém, o Dr. António Luiz Gomes, que, entusiasmado com o nosso idealismo e com o alcance do projecto, se lançou apaixonadamente numa campanha de recolha dos necessários meios materiais. Dirigindo-se a amigos seus, conseguiu rapidamente o total, impressionante para a época, de 51.000 escudos. Foi na verdade, meu irmão, António Luiz Gomes “Homem do-Diálogo, Da Solidariedade e Da Indulgência Partilhadas”, no dizer de Fernando Namora, que tornou possível o nosso ambicioso projecto.
Assim, foi contratado pela Junta de Investigação e não por qualquer outra instituição oficial, que António Monteiro se deslocou de Lisboa para o Porto com a família, em Dezembro de 1943 e aí permaneceu até à decisão de emigrar para o Rio de Janeiro, para onde embarcou precisamente no dia 28 de Fevereiro de 1945, de acordo com o telegrama que guardamos no arquivo da Junta de Investigação Matemática, graças à meticulosidade e dedicação do nosso querido amigo Leopoldo Fernandes, que tão abnegadamente se encarregou dos serviços de secretaria da JIM desde a sua fundação até ao encerramento das suas actividades. (...)
[Excerto de] Ruy Luís Gomes: Tentativas feitas nos anos 40 para criar no Porto uma Escola de Matemática.