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quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Certidão sobre o imposto de renda para a concessão de visto em passaporte (5 de Julho de 1949)

© Família de António Aniceto Monteiro
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(...)
Realmente acabei recebendo em meados de Maio um convite definitivo para San Juan, que aceitei. É o resultado dos esforços de vários amigos, entre os quais você figura, e por isso lhe quero enviar desde já um grande abraço de agradecimentos. Espero viajar em breve para a Argentina se não houver demora na concessão do visto, que foi pedido telegraficamente para a Direccion de Migraciones em Buenos Aires. Entretanto, estou preparando a minha viagem e espero não encontrar dificuldades. Estou muito cansado com o trabalho que tenho na companhia de aviação. Não consigo dar vencimento às cartas que tenho a escrever e por isso tenho que ser breve.
Estou desejoso de chegar a San Juan e recomeçar o meu trabalho.
(...)
[Carta de António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil) a Guido Beck (Córdoba, Argentina, de l2 de Junho de 1949]
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Não sei em que ponto está a tramitação do seu visto de entrada no país, para vir para San Juan.
Informei-me sobre o assunto em Buenos Aires e fiquei a saber, com satisfação, que não há nenhuma dificuldade de princípio na obtenção do seu visto, salvo as demoras burocráticas habituais.
Não será de modo nenhum difícil obter imediatamente o seu visto, mas, até agora não se pôde fazer nada a esse respeito, porque é impossível encontrar, na Direcção de Migrações, um processo sem saber exactamente o seu número.
No caso de demorar, e se o desejar, rogo-lhe que peça, no Consulado Argentino no Rio de Janeiro, o número exacto do seu processo, a data do seu envio para Buenos Aires e, eventualmente, outros dados que considerem úteis no Consulado e mós envie em seguida. Depois poder-se-á conseguir, em Buenos Aires, que a autorização correspondente seja dada imediatamente.
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[Carta de Guido Beck (Córdoba, Argentina) a António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil), de 8 de Julho de 1949]
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A minha situação actual é a seguinte: 1) Tenho os meus passaportes prontos desde o início de Junho, 2) O visto permanente foi pedido pelo Consulado, pelo telegrama n.° 49 de 3 de Junho de 1949 e até hoje não veio resposta (paguei o telegrama respectivo com resposta paga), 3) A Faculdade enviou ao Consulado os termos do meu contrato, solicitando a concessão do visto, se não estou em erro, 4) Recebi este mês carta do Secretário da Faculdade de San Juan, informando-me de que Migraciones solicitara «todos los dados personales dei referido y sus familiares (nombres, edad, religión, estado civil y se ha sido antiguo residente». Julgo que deve haver algum desencontro, porque no telegrama do Consulado iam todos os dados necessários, 5) Dizia-me ainda o Secretário: «sem respecto a su [ilegível] a nuestra Faculdad, me es grato manifestar a usted que el contrato respectivo se encuentra a Ia firma dei Senor Rector de Ia Universidad». Fiquei surpreendido com esta notícia porque julgava o caso já arrumado. Se assim não fosse, não teria os meus preparativos de viagem quase prontos.
Por outro lado estou interessado em viajar com a brevidade possível. Toda a minha vida está arrumada para ir para San Juan e os meus garotos teriam grande vantagem em frequentar o segundo semestre em San Juan. O mais velho deixará de terminar aqui o curso de ginásio por uma questão de poucos meses. Toda a demora suplementar provocar-me-á prejuízos e começo a ficar fatigado com o atraso. Aceito por isso com grande prazer os seus bons ofícios para abreviar o prazo necessário para a concessão do visto.
Acho que não poderei viajar com um visto temporário (de turista) porque vou levar muita coisa comigo: uma estante, geladeira, rádio, vários caixotes com livros, etc., que é uma bagagem um pouco pesada para turista.
A propósito de bagagem, recebi uma carta, de sua prima Olga, nos princípios deste mês - a carta traz a data de 30 de Abril, mas deve ser engano - em que me pede para levar com os meus baús um ou dois dela, acrescentando: «sem libros y unas cosas pequenas».
Estou com a melhor boa vontade e disposto a satisfazer-lhe a vontade desde que as coisas a transportar não sejam susceptíveis de criar dificuldade na alfândega. A Lídia tratará na altura de preparar a nossa bagagem, de resolver esse problema.
Já escrevi ao Santalló pedindo-lhe para se interessar pela concessão do visto, mas segundo parece ele não possui conhecimentos influentes, em Buenos Aires.
Estou porém muito esperançado com a notícia que me dá de que se poderá conseguir imediatamente o visto.
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[Carta de António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil) a Guido Beck (Córdoba, Argentina, de 3l de Julho de 1949]
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Espero que tenha recebido a carta que lhe escrevi recentemente, em que lhe pedia o seu auxílio para tratar do problema do meu visto. Recebi carta do Balanzat do 8 do corrente em que me comunica que falou com o Reitor. Este ia a Buenos Aires e prometeu ocupar-se pessoalmente do visto. Manda dizer que sabe a respeito do andamento do problema. Escrevi ao Pi Calleja e ao Santalló pedindo que tratassem do assunto. Seria necessário, segundo me parece, encontrar uma pessoa com influência capaz de resolver o problema em poucos dias.
Em qualquer hipótese mande-me notícias com a brevidade possível. A minha situação começa a tornar-se insustentável. Tenho tudo preparado para viajar, mas não posso fazer certas coisas antes de ter o visto. Espero entretanto que depois dele chegar me seja possível terminar os meus preparativos da viagem em poucos dias.
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[Carta de António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil) a Guido Beck (Córdoba, Argentina, de l6 de Agosto de 1949]
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Hoje tivemos resposta de Buenos Aires.
O Interventor da Direcção Geral de Migrações declarou pessoalmente que não há inconveniente algum em lhe concederem o visto de entrada no país e que ele está disposto a dar solução favorável ao assunto logo que lhe seja submetido o processo. Mas... o processo não o encontraram e não encontraram o telegrama que você me referiu.
Nestas condições, e para não perder tempo esperando até se encontrar o processo, o melhor que você pode fazer é ir ao Consulado Geral Argentino no Rio de Janeiro e pedir, eventualmente com fundamento nesta carta, que enviem cópia do seu pedido de visto para a Direcção Geral de Migrações em Buenos Aires (talvez seja preferível que seja por carta via aérea) e você mandar-me, simultaneamente todos os dados correspondentes (N. ° do processo, data da carta, etc.) para que se possa encontrar a carta em Buenos Aires e para conseguir que lhe dêem andamento imediato.
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[Carta de Guido Beck (Córdoba, Argentina) a António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil), de 23 de Agosto de 1949]
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Acabo de receber a sua carta de 23 de Agosto que muito lhe agradeço. Fui imediatamente ao Consulado para esclarecer os problemas de que me fala. O meu processo no Consulado consta das seguintes peças: 1) Telegrama n.° 49, de 3 de Junho de 1949, endereçado a «Migraciones», solicitando o visto. 2) Carta do Delegado Interventor da Faculdade de San Juan, dirigido ao Con¬sulado, com data de 2 de Junho, solicitando facilidades para a concessão do visto com a brevidade possível e dizendo que a Faculdade gostaria que eu chegasse em meados de Junho. Esta carta chegou ao Consulado no dia 7 de Junho. 3) No próprio dia 7 de Junho o Consulado telegrafou à Universidade de Cuyo, San Juan comunicando que o visto já tinha sido solicitado pelo telegrama n.° 49, de 5 de Junho, à Direccion de Migraciones. 4) Em 10 de Junho o Consulado escreve uma carta à Universidade confirmando o telegrama anterior (telegrama n. ° 23 do Consulado) que transcreveram, acusando a recepção da carta da Faculdade de 2 de Junho. Depois nada mais há. Na próxima segunda-feira, terei uma entrevista com o Cônsul, para ver se é possível esclarecer tudo isto.
A minha impressão no momento é a seguinte. O telegrama n. ° 49 deve andar perdido pela Direccion de Migraciones. Por outro lado deve haver uma diligência da Universidade junto da Migraciones solicitando o visto, independentemente do pedido feito por intermédio do Consulado.
Em 4 de Julho escreveram-me de San Juan, nota n. ° 853-M, dizendo que Migraciones solicitara à Facultad «Todos os dados personales dei referido - sus familiares: nombres, edad, religion, estado civil y si há sido antiquo residente». Esta carta expedida por via marítima, chegou com certo atraso. Respondi em 25 de Julho, por via aérea, enviando os dados solicitados. A Faculdade tem portanto todos os elementos necessários para localizar o pedido de visto. Tornarei a escrever na próxima 3.a feira (depois de amanhã), depois da minha entrevista com o Cônsul, informando-o do que se passa. Entretanto creio que poderia localizar o processo por intermédio de San Juan ou de Mendonça. Pedirei na 2.a feira ao Cônsul que me escreva uma carta a Migraciones, esclarecendo a situação e dir-lhe-ei o que houver a esse respeito.
Fico-lhe muito grato pelas eficientes démarches que tem realizado.
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[Carta de António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil) a Guido Beck (Córdoba, Argentina, de 27 de Agosto de 1949]
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Escrevi-lhe uma carta anteontem, hoje estive com o Cônsul. Peguei novo telegrama em que o Consulado pede o esclarecimento da situação. (Telegrama n.° 85, de 28 de Agosto de 1949). Nele se faz referência ao telegrama anterior n.° 49, de 3 de Junho de 1949. Segundo me declarou o Cônsul o número de um telegrama expedido pelo Consulado é largamente suficiente para localizar o pedido em Migraciones, acrescentando, é claro, que foi expedido pelo Consulado da Argentina no Rio e não é necessário indicar a data, basta o número de telegrama.
Creio que, pela minha parte, nada mais posso fazer, a não ser aguardar a [ilegível] do visto. Penso que a Universidade não tem actuado com a eficiência que seria necessária. Entretanto perdi um tempo preciosíssimo, fazendo parar todas as démarches que estavam em curso noutros países.
Não vou pôr imediatamente em andamento as démarches interrompidas, mas, nas condições actuais, acho que não devo recusar as oportunidades que me forem aparecendo. Há quatro dias atrás outra oferta me foi feita.
Sem romper os meus compromissos com San Juan entendo que não devo recusar definitivamente as propostas que recebi e começarei esta noite a tratar de uma delas. Guarde estas notícias para si. Entretanto devo dizer-lhe que neste momento ainda prefiro ir para San Juan, partirei imediatamente se o visto chegar antes de arrumar a minha vida para outro lado.
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[Carta de António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil) a Guido Beck (Córdoba, Argentina, de 29 de Agosto de 1949]
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O tempo passa, mas a solução não vem.
Não descurei o seu assunto. De San Juan escreveram-me dizendo que não sabem o n.° do seu processo, mas que o representante da Faculdade em Buenos Aires está a tratar da questão.
Tenho amigos muito próximos da Direcção de Migrações. Eles dizem: a) que lá havia dificuldades administrativas, de carácter geral, que não têm relação com o seu assunto, b) que não conseguiram localizar o seu processo, c) que todos, incluindo o Director Geral, estão atentos e dispostos a ajudar.
Suspeito, nesta altura, que não se empenharam o suficiente e acabo de escrever outra carta a outro amigo, pedindo que intervenha e verifique: a) se se consegue localizar os telegramas n.° 49 (3/6/49) e n.° 85 (29/8/49), b) no caso contrário, como agir exactamente para refazer, se necessário, os trâmi¬tes para obrigar o processo a andar.
É muito aborrecido que as coisas se passem assim. Mas o que podemos fazer para o evitar? Pergunte, eventualmente, no Consulado, se têm outra possibilidade melhor de chegar a uma solução e se, eventualmente, o Cônsul pode escrever ao Director Geral de Migrações ou a quem quer que seja competente na linha administrativa.
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[Carta de Guido Beck (Córdoba, Argentina) a António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil), de 25 de Outubro de 1949]
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Acabo de receber resposta do meu amigo de Buenos Aires. Confirma o que me haviam escrito os outros amigos e que, no fim, nem quis acreditar. Passou quatro dias no Ministério das Relações Exteriores e na Direcção Geral de Migrações, falou com toda a gente, viu tudo pessoalmente, conhece agora os dados pessoais, etc., de todos os Monteiros que pretendem entrar no país, mas entre eles não se encontra nenhum António Monteiro, e nenhum telegrama.
Como nem nós, nem você, temos o número do processo que podia facilitar os trâmites, conseguiu, por fim, que telegrafassem do Ministério para o Rio para averiguar o que se passa. Prometem resposta dentro de dez dias.
Você deveria ir ao Consulado Argentino e verificar se eles receberam o telegrama do Ministério de Buenos Aires pedindo informação sobre o seu caso. Peça ao Cônsul e informe-se de quando responde (N. ° do telegrama, se possível).
No caso de o telegrama não chegar, há que ver com o Cônsul o que pode ser feito para iniciar um novo processo de visto, de modo que depois se possa encontrar o novo processo em Buenos Aires, controlando todos os passos burocráticos.
Lamento não ter notícias mais favoráveis, mas você pode acreditar que não era coisa fácil esclarecer o que fizeram.
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[Carta de Guido Beck (Córdoba, Argentina) a António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil), de l1 de Novembro de 1949]
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Parto hoje, vapor Argentina, chego a Buenos Aires no dia 5.
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[Cartão de António Aniceto Monteiro (Rio de Janeiro, Brasil) a Guido Beck (Córdoba, Argentina, de 30 de Novembro de 1949]
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A morada de António Aniceto Monteiro indicada nestas cartas de Guido Beck é Rua Almirante Alexandrino 882, Ap. 204,St.a Thereza, Rio de Janeiro.

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Copiado de

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Ver ainda:
«Se não conseguirmos criar um movimento forte contra esta política, essa gente não vai parar. É preciso que o maior número possível de escolas e de cientistas protestem publicamente contra a perseguição dos homens de ciência de Portugal. É um dever de solidariedade para qualquer homem de ciência e um dever político para um antifascista.» (Carta de António Aniceto Monteiro a Guido Beck, 1947)
Brasil, 1948: «Isto é um inferno...» (Carta a Guido Beck, de 28 de Julho de 1948, proveniente do Rio de Janeiro)

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

«Acabo de sofrer um rude golpe...», «Já terminei com o trabalho da Aritmética...», «Eu também gostaria de voltarmos a trabalhar juntos» (Carta a Hugo Ribeiro, escrita de San Juan, Argentina, e datada de 4 de Janeiro de 1951)


© Família de António Aniceto Monteiro
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San Juan, 4 de Janeiro de 1951  
Caro Hugo: 
Recebi a sua carta de 16 de Dez. que muito lhe agradeço. Acabo de sofrer um rude golpe com o falecimento de minha mãe. A esperança que ambos tínhamos de nos tornarmos a ver ficou assim definitivamente malograda. 
Já terminei com o trabalho da Aritmética, que vamos apresentar a concurso. O Paulo deu-me a noticia das novas condições que regem a adopção dos livros para o ensino secundário suficientemente tarde para que tudo tivesse de ser feito à pressa e à última hora. E êle foi membro do juri qua examinou os trabalhos apresentados a concurso o ano passado. Agora há o sistema de livro único, havendo um concurso cada 5 anos. O ano passado reprovaram quasi tôdos os livros de matemática. 
Em virtude do programa, partimos dos axionas de Peano e aliviamos algumas partes da Aritmética. No fundo é quàsi um novo livro. Vou pedir ao Paulo que lhe mande uma cópia. 
Agora estou com vontade de redigir um livro de introdução à topologia geral, como lhe disse na última carta. 
Neste momento estou reoarganizando o meu curso de Análise. Este ano tratei dois capítulos sob o ponto de vista moderno a titulo de experiência: 1) Divisibilidade de Polinómios (ideais de polinómios) 2) Series de Fourier (Aproximação em media quadrática em espaços vectoriais euclideanos - pré-espaços de Hilbert). No fim do ano fiz um inquérito aos alunos para saber que partes do programa prefiriam. Ate agora os dois temas mais votados foram os dois anteriores. Por isso estou com vontade de modernizar completamente o curso. No proximo ano vou modernizar uma parte pelo menos. Começarei pela teoria dos conjuntos e vou dar uns elementos de topologia geral além das noções de anel, dominio de integridade e corpo que já introduzi este ano. Só farei estas coisas na medida em que elas forem susceptiveis de simplificar o estudo do programa da cadeira. 
Eu também gostaria de voltarmos a trabalhar juntos. Isso só seria possível se você viesse, não digo à Argentina porque a distancia é muito grande e a despesa proporcional, mas para a Argentina. Talvez que durante o próximo ano existisse alguma possibilidade de encontrar aqui uma situação. Porém a situação que você aqui teria não se poderia comparar sob o ponto de vlsta financeiro com a que tem actualmente. Além disso as com[od]idades aqui não são muitas, falta muita coisa. Não encontraria de modo algum o conforto e as facilidades de vida que existem em Norte America. segundo a opinião de varias pessoas que me têm contado como é a vida aí. A grande vantagem que aqui tenho, e que me parece importante , é o sistema de trabalho de que já lhe falei em cartas anteriores. Quatro meses de aulas e o resto do tempo livre para estudar, escrever e trabalhar. 
Na minha carta anterior já lhe falei das revistas portuguesas. Também recebi a porcaria do Júdice. Parece que o Zaluar não irá para Paris, ou pelo menos não é certo que vá, dados os corstes no orçamento para a Ciência. O Nelson também não respondeu a varias cartas que escrevi. Sobre a teoria dos operadores, parece-me que o melhor trabalho que se publicou é do Tarski e Mac Kinsey (dois trabalhos do Annals) - Closure algebraic functions, não sei se é êste o titulo, mas são recentes. Escreva quando tiver tempo. Bem, um abraço nosso para a Pilar e outro para si do amigo dedicado 
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terça-feira, 4 de setembro de 2012

Problemas da cultura matemática portuguesa


Problemas da cultura matemática portuguesa
António Aniceto Monteiro
(Professor da Universidade de San Juan, Argentina)


A caracterização da situação actual da cultura matemática portuguesa, o averiguar seus problemas fundamentais, determinar suas contradições, fracassos e debilidades, o determinar suas realizações e fundamentar suas esperanças, constitui um importante problema de carácter nacional. Trata-se de um problema de carácter nacional porque é um problema da cultura científica portuguesa e porque interessa o desenvolvimento da economia, o bem-estar social da população e a independência do país. Trata-se portanto de um problema de grande complexidade para o exame do qual se necessita da cooperação de um número considerável de estudiosos.
Uma das principais características da cultura matemática portuguesa é o seu atraso crescente em relação ao movimento matemático internacional, e é claro que esta situação é compatível com o desenvolvimento interno, mais ou menos lento, dessa cultura.
É de uma grande importância para o país a existência de estudiosos treinados nos métodos modernos do pensamento matemático, porque são susceptíveis de ser aplicados à resolução de variados problemas especiais que se apresentam em todos os sectores da vida. Trata-se de métodos potentes e fecundos de análise que podem conduzir o homem a conhecer a natureza para dominá-la e transformá-la em seu proveito e na perseguição de um tal objectivo o próprio homem necessariamente se modifica, como parte integrante da natureza.
Esta oposição entre o atraso crescente da cultura matemática portuguesa e a necessidade imperiosa do seu desenvolvimento rápido constitui um dos dados objectivos mais importantes do problema em estudo.
Os principais órgãos de difusão da cultura são as escolas superiores e é importante constatar que seus programas actuais de estudo não correspondem às necessidades do momento, devendo mencionar-se especialmente a organização da licenciatura em ciências matemáticas e as características dos respectivos doutoramentos. Nenhuma verdadeira vocação matemática pode deixar de ser diminuída perante uma tal orgânica de estudos, cristalizada em forma estável há dezenas de anos.
Os esforços que realizam alguns professores não alteram a situação de conjunto de tal licenciatura caracterizada por um conjunto rígido de cátedras de estudo obrigatório, com programas mais ou menos fixos, tudo sem nenhuma elasticidade, rígido e imóvel, sem contemplações pelas novas disciplinas que se vão criando e desenvolvendo. A tudo isto se deve agregar uma indiferença quase geral pelo pensamento original que se dissolve num ambiente hostil e sem estímulo, de onde resulta a ausência de bibliotecas matemáticas adequadas para o trabalho científico e de uma carreira para a investigação científica que encoraje as vocações.
Este panorama geral não sofre alterações, mesmo quando tivermos em conta certos factores construtivos:
– A actuação daqueles professores que, com o condicionamento referido, desenvolvem seus esforços com o objectivo de modificar a situação existente, dando o exemplo inestimável de uma vida dedicada ao estudo e ao ensino.
– A actividade do Instituto para a Alta Cultura que desde 1929 – quando se concretizou a sua criação, resultante de um vasto movimento de opinião que durou vários anos e que apontava o exemplo da Junta de Investigações Científicas de Madrid – tem fomentado o desenvolvimento dos estudos com a concessão de bolsas no estrangeiro e no país, criação de centros de estudo, subsídios a publicações, bibliotecas e laboratórios.
– O extinto Centro de Estudos Matemáticos de Lisboa, dependente do I.A.C., dirigido pelo saudoso professor Pedro José da Cunha com exemplar independência e seu grande carinho pelo desenvolvimento da matemática portuguesa, que encorajou um grupo de jovens a iniciar-se no trabalho de investigação.
– O extinto Centro de Estudos Matemáticos do Porto, dependente do I.A.C., dirigido pelo distintíssimo matemático Ruy Luís Gomes, a quem a cultura matemática portuguesa deve inestimáveis serviços e numerosas iniciativas. Constituía uma das maiores esperanças do movimento matemático português, com a sua eficiente orientação.
– A Portugaliae Mathematica e a Gazeta de Matemática, cuja publicação se deve à abnegação do Dr. Manuel Zaluar Nunes, a quem a cultura portuguesa fica devendo um exemplo do mais honroso merecimento e extremo valor – tem exercido conhecida influência no ambiente português e destacada repercussão internacional.
– A Junta de Investigação Matemática, que sob a direcção do ilustre matemático Aureliano de Mira Fernandes e de Ruy Luís Gomes, reúne estudiosos com o objectivo de fomentar os estudos matemáticos e promove publicações importantes, é uma chama em que vivem as esperanças de todos os que querem o florescimento da nossa cultura matemática.
Todas estas actividades, algumas das quais se interromperam por motivos extra-científicos com o consequente debilitamento da nossa cultura científica, constituem um destacado esforço de um pequeno número de estudiosos, para fomentar o desenvolvimento da investigação matemática, e se devemos reconhecer o merecimento de tão nobres actividades que alentam esperanças com fundamento, não devemos deixar de reconhecer que o panorama geral anteriormente referido se mantém, porque a direcção estratégica dos nossos estudos universitários não sofreu alterações.
Em nossa opinião, um dos problemas mais importantes da cultura matemática portuguesa é o da REFORMA DOS ESTUDOS MATEMÁTICOS. Seria necessário alterar substancialmente o quadro das disciplinas, a orgânica, a orientação dos estudos, os critérios da selecção e promoção do pessoal científico. Uma obra desta natureza não se improvisa, antes se prepara meticulosamente em artigos, debates, conferências e sobretudo com a formação de jovens investigadores com capacidade necessária para conduzir a cultura matemática portuguesa a um nível de tal natureza que a orgânica actual não possa subsistir. Sobre este ponto de vista os elementos construtivos a que nos referimos anteriormente têm desempenhado um papel fundamental, porque contribuíram, e continuam contribuindo, para a criação do ambiente geral em que as condições objectivas tornam possível e inevitável a transformação necessária. Podemos afirmar de um modo geral que a reforma dos estudos matemáticos é antes uma batalha em curso, do que uma batalha travada. Todos os insucessos devem ser considerados como temporários.
Creio que é de uma grande importância difundir a ideia de que toda a verdadeira reforma é o resultado de um esforço continuado e persistente, realizado por numerosos indivíduos, para atingir objectivos claros e bem definidos. A nossa juventude estudiosa tem, portanto, sobre os seus ombros uma pesada tarefa a realizar, e como os jovens estudantes de hoje serão os mestres de amanhã, neles devem residir todas as nossas esperanças e todas as nossas certezas.
Todos os esforços devem assim ser centralizados na preparação da juventude estudiosa para a investigação científica e para tal efeito é necessário criar a instituição que tenha esse objectivo específico.
Somos assim conduzidos a pensar que o problema principal do momento consiste na criação de um INSTITUTO PORTUGUÊS DE MATEMÁTICA que se dedique fundamentalmente à realização de trabalhos de investigação matemática e ao ensino da investigação matemática.
Esse Instituto deveria reunir o maior número possível de matemáticos portugueses com reconhecida capacidade para as tarefas referidas, seleccionados de acordo com o seu curriculum, e por ele deveriam ser contratados, em forma permanente ou temporária, especialistas estrangeiros que se tenham distinguido na formação de discípulos (sobretudo nos ramos de matemática que não são cultivados em Portugal). Ao mesmo tempo deveria ser criada uma carreira de investigador científico, com as respectivas promoções realizadas de acordo com os trabalhos de investigação publicados, e concedidas numerosas bolsas aos estudantes diplomados pelas Universidades e com vocação matemática.
Neste Instituto se formaria toda uma geração de estudiosos, de onde a Universidade deveria recrutar, no futuro, os seus quadros científicos. Se a criação de uma instituição da natureza que acabamos de indicar é de uma importância vital para o futuro da matemática portuguesa, e constitui uma velha aspiração do ambiente matemático português, não deixam de existir outras tarefas de grande importância como sejam a subsistência da Portugaliae Mathematica, da Gazeta de Matemática e das Publicações da Junta de Investigação Matemática, que se torna necessário assegurar por todas as formas.
A transformação da Sociedade Portuguesa de Matemática numa verdadeira Sociedade Científica, ampliando o número dos seus sócios, realizando Congressos Anuais para discutir os problemas do ensino secundário e superior, além das habituais conferências e comunicações, é outro problema que merece cuidadosa atenção, porque contribuirá para estimular os contactos pessoais, criando um ambiente de cooperação entre todos os matemáticos que é necessário concretizar. Essas reuniões, em que se procuraria congregar o maior número possível de matemáticos, deveriam ter um temário, tão amplo quanto possível, porque não existe nenhum aspecto da cultura matemática que não tenha o seu interesse.
Outro problema de primordial importância é o melhoramento do nível de vida dos matemáticos, sobretudo dos professores do ensino secundário e dos assistentes universitários.
A realização de cursos de férias, destinados aos professores para o aperfeiçoamento dos seus conhecimentos científicos, seria uma iniciativa de grande alcance, se fossem concedidas as facilidades de ordem económica indispensáveis.
De um modo geral o problema tem de ser encarado sob múltiplos aspectos, mas é claro que nunca devemos esquecer que o objectivo a atingir é a elevação do nível da cultura matemática portuguesa e que, portanto, a tarefa principal consiste em conduzir o maior número possível de estudiosos ao conhecimento do pensamento matemático moderno, encorajando aqueles que manifestem capacidade para o trabalho original.

sábado, 28 de julho de 2007

António Aniceto, Lídia e os filhos


Reprodução por meios fotográficos de Elza Amaral
© Família de António Aniceto Monteiro
A primeira fotografia foi tirada em César Aguilar, 598, Villa Palermo, San Juan. A segunda, deve ser de Bahía Blanca.
Ver:

António Aniceto Monteiro na Argentina

Reprodução por meios fotográficos de Elza Amaral
© Família de António Aniceto Monteiro

quinta-feira, 19 de julho de 2007

A vida prodigiosa de Mischa Cotlar

“La ética sin ciencia es ciega, y la ciencia sin ética es coja”.
“Sin cultura ética --basada en el amor y la cooperación; no en la rivalidad, la competencia o el deseo de poder-- difícilmente habrá solución a los grandes problemas de la humanidad”.
“Sin cultura ética, el desarrollo de la tecnología será como un arma peligrosa en manos de un niño”.
“Sin cultura ética, no habrá riqueza en el interior de los hombres. Si uno necesita lujos y placeres excesivos es porque su interior esta vacío”.
“Es necesaria una intensa y urgente difusión de las nociones básicas de la ética, para que se comprenda que los problemas humanos no se resuelven por la violencia o el poder sino mediante facultades superiores, latentes en todos los seres humanos”.
*
...
Fue admitido como miembro de la Unión Matemática Argentina; pero no como profesor universitario, por carecer de educación formal.
Lo rechazaron más de una vez, hasta que un célebre matemático norteamericano resolvió el problema. Marshall Harvey Stone, director del Departamento de Matemáticas de la Universidad de Chicago, había conocido a Cotlar en Buenos Aires. Deseoso de llevárselo a Estados Unidos, lo instó a que solicitara una beca Guggenheim. Cotlar lo hizo, con la recomendación de otro gran matemático norteamericano –George Birkhoff—y ganó el subsidio; pero no para ir a Chicago sino a Yale. Pasó allí un semestre, trascurrido el cual Stone logró que le renovaran la beca, pero con el fin de perfeccionarse en Chicago, donde en 1953 Mischa recibió un doctorado.
...
*
...
La modestia de Cotlar era conmovedora. Sadosky solía contar esta anécdota:
Cuando le ofrecieron una cátedra en la Universidad de Ciencias Exactas, Mischa se quejó porque consideró que el salario era excesivo. El decano, José Babini, cortó toda discusión con estas palabras: “Mischa, ¿no le da vergüenza, a usted que es un hombre de ideas filosóficas, estar discutiendo asuntos de dinero?”.
...
*
Tudo retirado de
O texto do artigo também pode ser visto:
por Rodolfo Terragno (de facto, o autor)

Telegrama relativo a “oferta da Universidad del Sur” datado de 27 de Fevereiro de 1956

Digitalização de Jose Marcilese
© Família de António Aniceto Monteiro

Primeiros Cursos Latinoamericanos de Matemática



Reprodução por meios fotográficos de Elza Amaral
© Família de António Aniceto Monteiro
Em Fevereiro de 1955 António Aniceto Monteiro lecciona um dos cursos dos Primeiros Cursos Latinoamericanos de Matemática patrocinados pela UNESCO, que se realizam no Instituto de Matemática de Mendoza, destinados ao aperfeiçoamento de Professores Universitários, ao qual assistem professores do Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Peru, Chile Argentina. Em 1956 é eleito pelos seus colegas do Instituto de Matemática de Mendoza, para realizar uma viagem ao Paraguai, Bolívia, Peru e Chile com o objetivo de estudar o aproveitamento dos bolseiros que tinham assistido aos mencionados cursos e ajudá-los no seu trabalho. Realiza esta viagem en 1956 patrocinado pela UNESCO, tendo logo apresentado a esta instituição, um pormenorizado relatório sobre a situação nos diversos países. As fotografias são dessa viagem, sendo as duas primeiras de Lima e a terceira de Buenos Aires.

Artigos de António Aniceto Monteiro [M20], [M21], [M23]



Reprodução por meios fotográficos de Elza Amaral
© Família de António Aniceto Monteiro

César Aguilar, 598, Villa Palermo, San Juan: António Monteiro, Lídia e os filhos

Reprodução por meios fotográficos de Elza Amaral
© Família de António Aniceto Monteiro

Revista Matemática Cuyana


Digitalização de Jose Marcilese
© Família de António Aniceto Monteiro

El contrato original por cuatro años con la Universidad en Rio de Janeiro no le fue renovado, por lo que Monteiro decide aceptar una posición en la Universidad Na­cional de Cuyo, en la ciudad de San Juan, Argentina, adonde llega a fines de 1949.
San Juan había sido desvastada por un terremoto unos pocos años antes, y a la llegada de Monteiro con su esposa y sus dos hijos, aún no estaba totalmente recons­truida. Otra vez se dedica intensamente al desarrollo de la matemática. Aparte de sus importantes investigaciones sobre las propiedades aritméticas de los espacios topológi­cos y de la modernización del curso de Análisis Matemático que dictaba, transmitió su entusiasmo al rector de la Universidad para la creación de un Departamento de Investi­gaciones Científicas, DIC, destinado a la investigación y a la formación de investiga­dores en las ciencias básicas. Esta especie de “escuela de graduados” fue una idea in­novadora en la estructura de las universidades argentinas de la época. En el Instituto de Matemática del DIC se formaron varios destacados matemáticos argentinos. También fundó la Revista Matemática Cuyana donde aparecieron publicados los im­portantes trabajos de Cotlar sobre transformada de Hilbert y teoría ergódica. Estando en la Universidad de Princeton a comienzo de los 70, y al saber la bibliotecaria que yo era argentino, me dijo que estaba preocupada porque tenían sólo dos volúmenes de esa re­vista, y que sus pedidos a lo largo de los años a la Universidad de Cuyo para continuar la colección habían sido infructuosos. Se quedó muy sorprendida cuando le respondí que tenían la colección completa. Efectivamente, los avatares políticos de la Argentina llevaron a la disolución del DIC en 1957, y a la suspensión de la publicación de la re­vista. Mischa Cotlar, que fue director del Instituto de Matemática, cuenta en una en­trevista reproducida en esta fotobiografía, la breve historia del DIC y la decisiva in­fluencia de Monteiro en su creación.
[De] Roberto Cognoli: (do Prefacio a) António Aniceto Monteiro - uma fotobiografia a várias vozes, una fotobiografía a varias voces.
Ver ainda:

Desenhos feitos por António Aniceto Monteiro para “Notas Cuyanas de Matemática”



Digitalização de Jose Marcilese
© Família de António Aniceto Monteiro

Não estou certo que estas Notas Cuyanas de Matemática tenham saído. Uma coisa são os desenhos, outra coisa é a realidade. O que saiu foi a Revista Matemática Cuyana embora só com dois números.

Apontamentos preparados para as aulas nos anos em que viveu em San Juan









Reprodução por meios fotográficos de Elza Amaral
© Família de António Aniceto Monteiro

quarta-feira, 18 de julho de 2007

San Juan, Argentina - o terramonto de 15 de Janeiro de 1944



Fotos de San Juan após o terramoto que no dia 15 de Janeiro de 1944 destruiu a cidade, provocando cerca de 10 000 mortos. San Juan foi depois reconstruida com edifícios anti-sísmicos, tendo a reconstrução durado até 1960.

Contrato com a Universidad Nacional de Cuyo


Digitalização de Jose Marcilese
© Família de António Aniceto Monteiro
Contrato (de 29 de Dezembro de 1950) com a Universidad Nacional de Cuyo. Poderá haver engano na data (1949 em vez de 1950).
Ver:

terça-feira, 29 de maio de 2007

Artigos publicado na revista «Ciência», números 9 e 10, de Setembro de 1954


Problemas da cultura matemática portuguesa, por António Aniceto Monteiro


Revista CIÊNCIA números 9-10 de Setembro de 1954





Revista Ciência. Nesta revista «Ciência», números 9 e 10, de Setembro de 1954, foi publicado o artigo «Problemas da cultura matemática portuguesa», escrito em San Juan por António Aniceto Monteiro. A revista e a «I semana de matemática» foram parcialmente financiadas pela J.I.M. O prefácio é de João Santos Guerreiro, Director da Secção Pedagógicada A.E.F.C.L., em 1952-53, futuro professor catedrático de matemática da Faculdade de Ciências de Lisboa.
Ver:
Um comentário: esta revista e esta carta são documentos notáveis!