quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

A guerra no sul de Angola em 1914 (1)


(...)
Paralelamente aos serviços, que ia prestando o emissário José Guerreiro, homem que, pelos parentescos que tinha no país dos Cuambis e relações com o respectiva soba, estava em óptimas condições de nos obter informações sobre a Damaralandia, como de facto obteve, exercia no próprio território dos Cuanhamas idênticas funções o sertanejo Fraga, um dos mais destemidos e desembaraçados portugueses que temos encontrado em África.
Valente até a temeridade, fecundo em expedientes, com um predomínio supersticioso entre o gentio, com quem lida, conhecedor da região de Cuanhama, do carácter do soba e dos lengas principais que lhe formam a côrte, o Fraga foi um dos mais valiosos elementos de que lançámos mão, como agente de informaçâo.
Pena foi que os seus arriscados trabalhos não tivessem podido ser aproveitados, visto o grande contratempo que, como adiante teremos ocasião de ver, nos transtornou por completo o plano que havíamos delineado.
Mas não foi só o serviço de informações que nos prendeu, logo desde começo, a atenção.
O reconhecimento militar do baixo Coroca, no litoral de Mossâmedes, e o estudo do seu acesso possível às regiões de Otchinjau, através dos contrafortes da Chela, foi um dos problemas que também tratámos de confiar a dois oficiais, qual deles mais competente por vários motivos, entre os quais o da prática já de semelhantes trabalhos em África: capitão Albano de Melo e tenente Monteiro, este último há pouco falecido em virtude das agruras sofridas.
O objectivo imediato destes estudos era encontrar uma posição militar que fechasse o acesso do baixo Cunene a Porto Alexandre e a Mossâmedes, e verificar se era possível pôr em ligação a força que porventura viesse guarnecer aquela posição com as futuras forças do sector de defesa do Pócolo.
Outros estudos de reconhecimento foram mandados efectuar mais tarde em outras regiões, e de que tratamos na devida altura.
(...)

Alves Roçadas, Relatório sobre as operações no sul de Angola em 1914. Lisboa, Imprensa Nacional, 1919 (350 páginas). O fragmento aqui reproduzido é das páginas 111 e 112.


Nota: Os acontecimentos aqui relatados referem-se ao início de Novembro de 1914, como veremos. Recordemos que «no final de 1914, os alemães invadiram o sul de Angola. A 18 de Dezembro de 1914, em virtude de opções tácticas erradas, Alves Roçadas é derrotado em Naulila pelas tropas alemãs». Ver neste blogue: Naulila, Alves Roçadas.